Abão de Magheranoidhe – Wikipédia, a enciclopédia livre

Santo Abão de Magheranoidhe
Abão de Magheranoidhe
Capela de São Cormac, capela cristã em Eilean Mòr, Jura, nas ilhas MacCormaig (Escócia). Assim como a igreja de Keills (Kilvickocharmick), pode estar associada a Abão.[1]
Nascimento ca. 570
local exato desconhecido; Irlanda
Morte 16 de março de 620 (50 anos)
Veneração por Igreja Católica
Principal templo Magheranoidhe, Adamstown, Condado de Wexfor, Irlanda
Festa litúrgica 16 de março, 27 de outubro
Portal dos Santos

Abão de Magheranoidhe (também chamado de Abbán ou Abão de Murneave ou de Murnevin; circa 57016 de março de 620) é um santo da tradição irlandesa. Foi associado inicialmente com Mag Arnaide (Moyarney ou Adamstown, condado de Wexford, perto de New Ross) e com Cell Abbáin (Killabban, condado de Laois).[2] Seu culto esteve, contudo, também ligado a outras igrejas em outros locais da Irlanda, juntamente com o de sua suposta irmã Gobnait.

Foi sobrinho de Santo Ibar, conhecido como o Apóstolo de Wexford (predecessor e contemporâneo de São Patrício).

Filho de Cormac, Rei de Leinster, e fundador de inúmeras igrejas no distrito de Ui Cennselaigh, próximo dos atuais Condado de Wexford e da Diocese de Ferns. Seu principal monastério foi o de Magheranoidhe, posteriormente conhecida como Abbanstown, hoje a atual Adamstown, na Irlanda. Também é contado como sendo o fundador da abadia de Ros-Mic-Treoin ou de New Ross, que, mais tarde, ficou conhecido como importante centro escolástico. Santo Abão morreu em 16 de março de 620.

Ele é referenciado em The Lives of the Saints (As Vidas dos Santos) e em Lives of the Irish Saints (Vidas dos Santos Irlandeses).[3]

Fontes[editar | editar código-fonte]

Três recensões da Vida do santo chegaram até os nossos dias: duas em latim e uma em irlandês. As versões latinas são encontradas no Codex Dublinensis e no Codex Salmanticensis, enquanto que a versão irlandesa está preservada incompleta em dois manuscritos: o manuscrito de Mícheál Ó Cléirigh, Bruxelas, Biblioteca Real MS 2324-40, fos. 145b-150b e Real Academia de Irlanda (RIA), Stowe MS A 4, pp. 205–21.[4] Essas Vidas provavelmente derivam de um exemplar em latim escrito por volta de 1218 pelo bispo de Ferns, Ailbe Ua Maíl Muad (Ailbe O'Mulloy), que morreu em 1223.[2] Seu interesse no santo, em parte, resultou do fato de que Mag Arnaide fazia parte da diocese de Ferns, mas como esta era apenas uma pequena igreja naquele tempo, algo mais deveria estar envolvido.[2] Um episódio que mostra algo de apego pessoal de Ailbe ao culto do santo é o lugar onde o santo chegou, na região entre Éile e Fir Chell, ou seja, nas caminhadas entre Munster e Leinster: Abão converteu um homem de posição real da região e batizou seu filho. Ailbe é conhecido por ter sido um nativo desta região, mas o seu próprio comentário como aparentemente preservado na Vida de Dublin, identifica a conexão mais claramente: "Eu, que reuni dados e escrevi a Vida sou um descendente [nepos ] daquele filho"[2][5] Contudo, as circunstâncias imediatas que levaram à composição da Vida são susceptíveis de terem sido políticas, relativas à presença normanda na diocese de Ferns. Para apoiar o seu caso, Ailbe fez muitas das amplas conexões do santo com outras igrejas e santos, fazendo-o viajar por todo o país e, no caso da anedota sobre Abingdon (ver abaixo), até mesmo inventando tradições.[2]

Outras fontes para a vida e culto a Abão incluem as genealogias irlandesas dos santos e as inscrições para o dia de sua festa litúrgica no calendário hagiológico. Sua árvore genealógica é dada no Livro de Leinster, Leabhar Breac, Rawlinson B 502 e nas glosas de sua inscrição no Félire Óengusso.[6]

Vida[editar | editar código-fonte]

Sua árvore genealógica nas genealogias irlandesas, que parece ter sido composta no interesse de Cell Abbáin, sugere que ele pertencia à Uí Chormaic (também Moccu Chormaic).[2] Uma nota em irlandês para o Félire Óengusso (de 27 de outubro), identifica o seu pai como Laignech (lit. "Homem de Leinster"), filho de Cainnech, filho de Imchad, filho de Cormac, filho de Cúcorp.[6] As Vidas, por outro lado, não mencionam algumas gerações tornando Cormac, rei de Leinster, seu pai e dando o nome de sua mãe de Mílla. Na verdade, as Vidas confundem o tempo de vida do santo, atribuindo-lhe mais de 300 anos.[7] Ele é colocado em contato com santos ilustres como Finnian de Clonard, Brandão de Clonfert (m. 577), Columba (m. 597), Gregório, o Grande, Munnu e Moling. Um dos povoados fundados pelo santo teria sido repetidamente saqueado por Cormac mac Diarmata (fl. segunda metade do século VI), rei de Leinster do grupo Uí Bairrche, que é retratado na hagiografia de Leinster como um grupo rival dos Uí Chennselaig. Abão também é mencionado como sendo contemporâneo de personalidades como São Íbar, que é reivindicado a ser o seu tio materno, e São Patrício.

Nada se sabe sobre o início da vida de Abão. As Vidas contam que esperava-se que ele sucedesse seu pai em Leinster, mas que a sua devoção a Deus e os milagres que realizava ainda quando muito jovem, logo deixaram claro que ele estava destinado a uma carreira religiosa. O menino foi enviado para o seu tio materno, o bispo Íbar, com quem viajou para Roma. Na Itália, os poderes de santo Abão provaram ser de muita utilidade para afastar qualquer perigo apresentado pelos homens, monstros e fenômenos sobrenaturais. Ao longo do texto, Abão pode ser visto demonstrando seus poderes, exercendo autoridade especial sobre rios e mares.

Fundações[editar | editar código-fonte]

As glosas para as duas entradas de Abão no Félire Óengusso associam-no com Mag Arnaide (condado de Wexford), no território dos Uí Chennselaig (também Uí Buide), e com Cell Abbáin (condado de Laois), no território dos Uí Muiredaig.[6]

Contudo, as atividades de Abão foram também associadas a muitas outras partes da Irlanda. Uma nota especial é a tradição de que Santa Gobnait foi sua irmã e que seu túmulo encontrava-se perto de sua igreja ou convento em Bairnech, atual Ballyvourney (Muskerry, condado de Cork).[2] Como as posteriores recensões sugerem, a original Vida de Ailbe parece basear-se neste contexto, ao afirmar que Abão fundou Ballyvourney e deu-a a sua irmã.[2] De acordo com as Vidas dele, Abão começou a fundar uma série de igrejas depois de voltar de uma segunda visita a Roma. Dentre as igrejas que alega-se ter sido fundada por ele estão: Cell Ailbe (condado de Meath) e Camross (condado de Laois).

Os Bolandistas argumentaram que o Abão de Mag Arnaide e o Abão de Cell Abbáin foram originalmente dois santos distintos, um comemorado em 16 de março, e o outro, em 27 de outubro, mas que os dois foram confundidos desde muito tempo.

Abingdon e as relações irlando-normandas[editar | editar código-fonte]

A Vida invoca a alegação falsa de que Abingdon, a cidade perto de Oxford, é para ser explicada etimologicamente como Abbain dun, a "cidade de Abão". O mito etiológico diz que a cidade ganhou o seu nome do santo, porque ele converteu o rei e o povo da região.[2][8] A história não foi um caso isolado. A etimologia é também levantada pelo autor que revisou as crônicas do século XII, Historia Ecclesie Abbendonensis ("A História da Igreja de Abingdon"). Como a abadia de Abingdon ficava em um vale, ele prefere a derivação irlandesa: "Por termos aprendido com os nossos contemporâneos que, de acordo com o idioma dos irlandeses, Abingdon é interpretado como 'casa da Aben"; mas de acordo com o idioma dos ingleses, Abingdon geralmente significa a "colina de Aben."[9]

Pádraig Ó Riain propõe que o episódio da Vida do santo foi destinado a oferecer algum contrapeso contra a propaganda inglesa, que afirmou que a necessidade de orientação religiosa e eclesiástica justifica a presença inglesa na Irlanda; e que, na verdade, a conveniência lingüística foi o que fez o santo de uma igreja menor fosse um protagonista adequado.[2] Mais especificamente, Ailbe pode ter escrito a sua Vida em resposta a sua briga com William Earl Marshall, que tinha confiscado duas mansões perto de New Ross, e os normandos, em vez dos irlandeses podem ter sido o seu público-alvo.[10] Tem sido argumentado que a ocasião formativa para a história foi uma visita a Abingon feita em 1080 por Lorcán Ua Tuathail (Lawrence O'Toole), arcebispo de Dublin, que ficou lá por três semanas antes de acompanhar Henrique II até a Normandia. Ailbe, sendo um dos discípulos do arcebispo, pode ter estado presente.[9]

Comemoração[editar | editar código-fonte]

No Martirológio de Tallaght, no Félire Óengusso e no Martirológio de Gorman, Abão tem duas festas litúrgicas: 16 de março e 27 de outubro,[6] que são identificadas nas Vidas como sendo as datas de sua morte. O Martirológio de Donegal, de John Colgan e Ó Cléirigh, menciona apenas Abão em 16 de março.

Suas entradas no Félire Óengusso elogiam-no como um "arbusto angelical de ouro" (doss óir ainglech) e "um abade justo e instruído" (abb cain clíarach).[6]

Referências

  1. Fisher, I. (1997). «Early Christian archaeology in Argyll». In: Graham Ritchie. Archaeology of Argyll. Edinburgh. pp. 181–204: 191 
  2. a b c d e f g h i j Ó Riain, "Abbán"
  3. Holweck, F. G. "A Biographical Dictionary of the Saints". St. Louis, MO: B. Herder Book Co., 1924.
  4. Irish Life of St Abbán, ed. Plummer, p. xiv.
  5. Latin Life of St Abbán in the Codex Dublinensis, ed. Plummer, §26.
  6. a b c d e Félire Óengusso, 16 de março e 27 de outubro.
  7. Latin Life of St Abbán in the Codex Dublinensis, ed. Plummer, § 17.
  8. A Vida em latim de Santo Abão no Codex Dublinensis, ed. Plummer § 14.
  9. a b Historia Ecclesie Abbendonensis, ed. Hudson, p. xliii.
  10. O'Neill, "The impact of the Norman invasion", p. 178.

Fontes primárias[editar | editar código-fonte]

  • Félire Óengusso ("O Martirológio de Óengus"), ed. e tr. Whitley Stokes (1905). The Martyrology of Oengus the Culdee. Henry Bradshaw Society. 29. pp. 82, 98-9 (16 de março), 219, 228-9 (27 de outubro).(PDF aqui)
  • Vida de Santo Abão em latim, no Codex Dublinensis, ed. e tr. Charles Plummer (1910). Vitae Sanctorum Hiberniae. vols. 1 e 2. Oxford: [s.n.] 
  • Vida de Santo Abão em latim, no Codex Salmanticensis, ed. W.W. Heist (1965). Vitae Sanctorum Hiberniae ex codice olim Salmanticensi nunc Bruxellensi. Bruxelas: [s.n.] 
  • Vida de Santo Abão em irlandês, ed. e tr. Charles Plummer e R.I. Best (1922). Bethada Náem nÉrenn. Lives of the Irish saints. Oxford: Clarendon Press 
  • Genealogias dos santos, ed. Pádraig Ó Riain (1985). Corpus Genealogiarum Sanctorum Hiberniae. Dublin: [s.n.] 
  • Historia Ecclesie Abbendonensis, ed. e tr. John Hudson (ed.) (2007). Historia Ecclesie Abbendonensis: The History of the Church of Abingdon Volume 1. Oxford, Reino Unido: Oxford University Press. ISBN 0199299374 

Fontes secundárias[editar | editar código-fonte]

  • Pádraig Ó Riain. «Abbán». Dictionary of Irish Biography. Consultado em 7 de março de 2010 
  • P. O'Neill. «The Impact of the Norman Invasion on Irish Literature». Anglo-Norman Studies. 20. pp. 171–85 

Leituras adicionais[editar | editar código-fonte]

  • Edward Culleton (1999). «St Abbán of Adamstown». Celtic and Early Christian Wexford: AD 400 to 1166 (em inglês). Dublin: Four Courts Press. pp. 97 ff. ISBN 1-85182-515-0 
  • W.W. Heist (1976). «Over the writer's shoulder: Saint Abban». Celtica (em inglês). 11. pp. 76–84 
  • Donnchad Ó Corráin e F. Maguire (1981). Gaelic Personal Names. [S.l.: s.n.] 
  • Michael J. O'Kelly (1952). «St. Gobnet's House, Ballyvourney, Co. Cork». Journal of the Cork Historical and Archaeological Society (em inglês). 57. pp. 18–40 
  • Ó Riain, Pádraig; et al. (1983–1986). «St Abbán: the Genesis of an Irish Saint's Life». In: D.E. Evans,. Proceedings of the Seventh International Congress of Celtic Studies. Oxford. pp. 159–70 
  • Diarmuid Ua hÉaluighthe (1952). «St. Gobnet of Ballyvourney». Journal of the Cork Historical and Archaeological Society (em inglês). 57. pp. 43–61