Casa do Patronato Agrícola – Wikipédia, a enciclopédia livre

O Patronato Agrícola pouco depois de sua inauguração em 1928

A Casa do Patronato Agrícola é um prédio histórico localizado na Rua Doutor Antônio Casagrande, no Bairro Marechal Floriano, em Caxias do Sul, Brasil.

O Patronato Agrícola de Caxias do Sul foi uma instituição assistencialista e educativa idealizada pelo intendente Celeste Gobbato. O governo brasileiro havia regularizado a criação dos patronatos agrícolas em 25 de julho de 1919, estabelecendo que tais instituições deveriam atender exclusivamente os menores pobres e dar-lhes educação moral, cívica, física e profissional, com um foco no trabalho agrícola, com o fim de integrar, com conhecimentos modernos, essa população desvalida nas classes produtivas rurais.[1] Uma primeira experiência na cidade neste sentido havia sido iniciada em 1918 pela Escola de Engenharia de Porto Alegre como uma seção do Patronato Agrícola do Rio Grande do Sul, e incorporada pela Escola Industrial Elementar, sendo inaugurada em 1920. A escola ministrava educação básica e profissionalizante, dava atendimento médico e recebia estudantes internos e externos. Os trabalhos agrícolas eram realizados em um campo de 8 mil m2, e incluíam jardinagem, cultivo de hortaliças e frutas, além de pequenas lavouras de batata, milho e feijão.[2]

Inicialmente o curso teve um expressivo sucesso, dando uma formação superior àquela ministrada os candidatos a operários, mas em torno de 1922 entrou em declínio e foi encerrado em 1924. Considerando o apoio às classes agrícolas uma das prioridades da sua administração, Gobbato reativou a ideia e lançou uma campanha para a criação de um patronato nos moldes fixados pelo governo federal. Uma comissão foi formada sob a presidência de Demétrio Niederauer, com apoio das Damas de Caridade, para colaborar na fundação, foi obtido um terreno e o projeto para o prédio foi desenvolvido pelo arquiteto italiano Luiz Gastaldi Valiera. Um jornal foi fundado em 1927 para promover a ideia, O Popular, que circularia até 1930. A construção iniciou em fins de 1927, e foi inaugurada por Getúlio Vargas em 22 de abril de 1928, iniciando suas atividades em agosto, contando com uma grande extensão de terras.[1][3] Em 5 de outubro de 1928 recebeu seu Regulamento, onde se determinava que funcionaria como uma escola prática de agricultura, e que...

"Será exclusivamente destinado às classes pobres, e visa a educação moral, física, cívica e profissional de menores desvalidos que forem internados. O Patronato Agrícola constitui em seu conjunto, um instituto de assistência, proteção e tutela moral dos menores, recorrendo para esse efeito ao trabalho agrícola, sem outro intuito que não o de utilizar sua ação educativa como o fim de os dirigir e orientar até incorporá-los no meio rural".[1]
Internos do Patronato Agrícola em 1930

Como presidente foi nomeado João Issler e como diretor, o agrônomo Salvador Petrucci, que também ocupava o cargo de Inspetor Escolar do município. O professor Firmino Bonett foi nomeado auxiliar. No primeiro ano foram matriculados doze alunos. Embora defendido por Gobbato como uma "obra patriótica", o Patronato recebeu diversas críticas, especialmente pelo alto custo do elegante casarão criado para a sua sede, que consumiu mais de 83 contos de réis, e pelo pequeno número de jovens beneficiados.[1][3] Desativado em 1930 pelo intendente Thomaz Beltrão de Queiroz, sua decisão também despertou críticas, e sendo obrigado a justificar-se junto ao Conselho Municipal, alegou a desproporção entre os custos de manutenção e os benefícios produzidos, mas prometeu não desamparar os internos, pretendendo encaminhá-los a outras instituições.[3]

Em 1935 o prédio estava abandonado e já necessitava reparos, e o candidato a prefeito Dante Marcucci pretendia destiná-lo a alguma congregação religiosa.[4] Marcucci foi eleito e os Lassalistas efetivamente assumiram o edifício em 1936, dando continuidade às atividades como uma escola de artes e ofícios para menores nos moldes da Fundação Pão dos Pobres de Porto Alegre, dotada também de um curso de viticultura e enologia.[5][6]

Os trabalhos dos Lassalistas duraram pouco e em 1938 o prédio foi posto à disposição do Governo do Estado e reformado para servir de abrigo e reformatório de menores, inaugurado em 1939 com o nome Escola Educacional 10 de Novembro.[7][8] Em 1952 a instituição foi extinta e seu grande terreno foi loteado em 500 parcelas destinadas primariamente à construção de moradias populares. Alguns lotes foram doados para a construção do Abrigo da Velhice, de um hospital e da Casa da Criança.[9][10]

O prédio principal foi repassado às Irmãs do Sacré-Coeur de Marie, que realizam diversas modificações no espaço físico e instalaram uma creche e um internato para meninas. As irmãs se retiraram em 1961, sendo ocupado por alguns meses por funcionários do DAER, e em 1962 duas salas foram emprestadas para o recém criado Instituto Mário Totta (APAE). Em 1969 a APAE recebeu todo o prédio em doação da Prefeitura, instalando salas de aula, oficinas e clube de mães.[5][11][12] Com a construção de um anexo moderno em 1981, a APAE negligenciou o prédio histórico e ele caiu em abandono, e nesta condição permaneceu por anos, deteriorando-se.[13][5][14] Em 1989, já muito arruinado, a APAE solicitou à Prefeitura a sua demolição, por considerá-lo perigoso, mas o Conselho Municipal de Patrimônio considerou que tinha grande valor histórico e recomendou seu tombamento, o que impediu a derrubada.[11] O tombamento não aconteceu, mas em 1992 a Sociedade de Engenharia, Arquitetura, Agronomia e Química de Caxias do Sul firmou uma parceria com a Prefeitura e a APAE para uma reforma da ala norte, com o intuito de ocupar a edificação,[14] sendo reinaugurada em 7 de outubro de 1993 como sede da Sociedade e da Inspetoria do Conselho Regional de Engenheiros e Arquitetos.[15]

Em 1998 o presidente da APAE e a presidente da Fundação Viva Città solicitaram ao poder público a proteção do edifício, reconhecendo seu valor histórico.[16] Foi tombado em 8 de setembro de 2003,[17] e um restauro foi iniciado em 2010.[18]

É uma casa de três pavimentos, mais o torreão, em estilo eclético, com uma área construída de 632 m2 e coberturas em quatro águas. Possui volumetria dinâmica e elevado valor estético, com quatro fachadas livres e bem definidas, e três blocos principais: a circulação ao centro, a administração ao norte e os aposentos para os estudantes ao sul. O interior apresenta um sistema construtivo peculiar, no qual se mesclam escadas e entrepisos em concreto, ferro e madeira, vigas de madeira maciça e divisórias em alvenaria, madeira e estuque.[12]

Ver também[editar | editar código-fonte]

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Referências

  1. a b c d Luchese, Terciane Ângela. "Expandir as escolas, aumentar a frequência, valorizar a agricultura: Celeste Gobbato e a educação municipal (Caxias do Sul, RS, 1924-1928)". In: Cadernos de História da Educação, 2019; 18 (1): 43-68
  2. Tisott, Ramon Victor. Formar trabalhadores, transformar a sociedade: o ensino industrial em três tempos (Caxias do Sul, 1901-1964). Doutorado. UFRGS, 2017, pp. 123-130
  3. a b c Monteiro, Katani Maria Nascimento. Um Italiano Irrequieto em Contexto Revolucionário - Um estudo sobre a atuação de Celeste Gobbato no Rio Grande do Sul (1912-1924). Doutorado. PUCRS, 2001, pp. 101-120
  4. "A Palavra do futuro prefeito de Caxias". O Momento, 07/11/1935, p. 2
  5. a b c "Patronato Agrícola". Folha de Hoje, 16/12/1989, p. 12
  6. "Vae ser inaugurado o Patronato Agrícola". O Momento, 28/12/1936, p. 6
  7. "Uma grande iniciativa". A Época, 02/10/1938, p. 1
  8. "Será brevemente inaugurada a Escola Educacional 10 de Novembro". A Época, 02/04/1939, p. 1
  9. "Distribuição de lotes". Pioneiro, 02/08/1952, p. 10
  10. "Aprovado o loteamento dos terrenos do Patronato Agrícola". A Época, 22/01/1953, p. 1
  11. a b Ferreira, Marlei. "Patronato Agrícola". Pioneiro, 03-04/02/1990, pp. 6-7
  12. a b Costantin, André. "Casa do Patronato volta a respirar". Pioneiro, 07-08/08/1993, p. 3
  13. "Conscientização do problema do excepcional". Jornal de Caxias, 24/08/1974, p. 5
  14. a b "Prefeito vai rever projeto de preservação histórica". Folha de Hoje, 17/09/1992, p. 3
  15. "Reinaugura, hoje, a Casa do Patronato". Folha de Hoje, 07/10/1993, p. 3
  16. "Câmara Municipal de Caxias do Sul". Gazeta de Caxias, 28/10-04/11/1998, p. 17
  17. "Caxias do Sul – Patronato Agrícola". IPatrimônio
  18. "Prédio do extinto Patronato Agrícola está sendo restaurado em Caxias do Sul". Pioneiro, 16/10/2010