Desacato – Wikipédia, a enciclopédia livre

Crime de
Desacato
no Código Penal Brasileiro
Artigo 331
Título Dos crimes contra a Administração Pública
Capítulo Dos crimes praticados por particular contra a Administração em geral
Pena Detenção, de seis meses a 2 anos, ou multa
Ação Pública incondicionada
Competência Juizado Especial Criminal

O Desacato, é considerado crime pelo Código Penal Brasileiro em seu art. 331, segundo o qual "desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa."[1] São dois os elementos que integram o delito: (1) a conduta de desacatar funcionário público; (2) no exercício da função ou em razão dela.[2]

Segundo Nelson Hungria, "a ofensa constitutiva do desacato é qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência ao funcionário. É a grosseira falta de acatamento, podendo consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos obscenos, gritos agudos etc."[3]. Deduz-se, pois, que a crítica ou mesmo a censura, ainda que veementes, não constitui desacato, desde, obviamente, que não se apresentem de forma injuriosa.

Críticas[editar | editar código-fonte]

Muitos entendem que o crime de desacato é inconstitucional.[4]. Viver numa democracia impõe adequar-se a certos padrões. Colher dela não apenas as vantagens de fruir das liberdades públicas, como também os desafios (e mesmo os inconvenientes) de evitar a todo custo um modelo de ordem pública que possa descambar para o autoritarismo. É certo que a vida em sociedade requer um grau satisfatório de deferência às normas jurídicas e às instituições por elas criadas e reguladas. Certo, outrossim, que essas mesmas instituições não estão autorizadas – nos termos dos princípios de um Estado democrático de direito – a extrapolar um nível moderado ou razoável de imposição da força a fim de compelir ao cumprimento de suas decisões e ordens.[4]

Inspirada por sua missão político-institucional (e constitucional) de vigiar os excessos de coerção e as ameaças, mesmo que cotidianas e sutis, ao regime democrático, a OAB[5] mais uma vez atendeu à conclamação para defender a cidadania. O Conselho Federal da OAB[6] ajuizou ADPF com a finalidade de questionar a constitucionalidade do tipo penal de desacato, inscrito no art. 331 do Código Penal. Pede-se que o referido injusto penal, decretado em um período ditatorial e impregnado de arbitrariedades, seja posto afora do âmbito de recepção da Constituição Cidadã de 1988, democrática por excelência. Os argumentos são fartos: evocam desde princípios constitucionais positivados (liberdade de expressão, legalidade, republicanismo, igualdade e Estado democrático de direito) até princípios definidos em normas de direito internacional (como o direito humano à liberdade de expressão na crítica à atividade estatal).[4]

Diversos operadores do direito entender que o crime de desacato é inconstitucional[7], como a Defensoria Pública[8], Ministério Público Federal[9] e a Ordem dos Advogados do Brasil[10]

Em 15.12.2016, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)[11] decidiu que desacato a autoridade não pode ser considerado crime porque contraria leis internacionais de direitos humanos, porque a tipificação é incompatível com o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos, de 22 de novembro de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), que garante a qualquer pessoa o direito à liberdade de pensamento e de expressão.[12] O ministro relator, Ribeiro Dantas, ratificou os argumentos apresentados pelo Ministério Público Federal de que os funcionários públicos estão mais sujeitos ao escrutínio da sociedade, e que as “leis de desacato” existentes em países como o Brasil atentam contra a liberdade de expressão e o direito à informação. Ressaltou, ainda, que o STF já firmou entendimento de que os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil têm natureza supralegal. Para a turma, a condenação por desacato, baseada em lei Federal, é incompatível com o tratado do qual o Brasil é signatário. [12]Por fim, o relator observou que a descriminalização da conduta não significa que qualquer pessoa tenha liberdade para agredir verbalmente agentes públicos, ou seja, o afastamento da tipificação criminal do desacato não impede a responsabilidade ulterior, civil ou até mesmo de outra figura típica penal (calúnia, difamação, injúria – CP, arts. 138, 139 e 140), pela ocorrência de abuso na expressão verbal ou gestual ofensiva, utilizada perante o funcionário público.[12]

Conforme Conrado Hübner Mendes[13], "o crime de desacato é indispensável à violência policial brasileira. Por meio dele, prende-se frentista que não deixa policial furar a fila da gasolina; fiscal de trânsito que multa magistrado; assistente social que questiona abordagem policial a crianças; estudante que rejeita assédio de policial; jovens que protestam; a viúva de Amarildo." Diversas democracias do mundo já aboliram esse crime, por violação da liberdade de expressão. Tribunais e comissões internacionais de direitos humanos convergem. No Brasil, o tema está em aberto. Após algumas decisões pela inconstitucionalidade do crime de desacato, tomadas por tribunais estaduais e pelo STJ, o tema chegou ao STF por via de duas ações: um habeas corpus indeferido e uma arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) pendente.[13] Se a integridade física ou moral de qualquer um deles for afetada, invocar desacato é desnecessário. O desacato não serve para proteger a honra da pessoa do agente público, pois para isso o Código Penal oferece a injúria. Não serve para preservar a autoridade do Estado, pois para isso há, entre outras coisas, os crimes de desobediência e resistência. Não serve sequer para catalisar um “governo das leis”, pois o conceito de desacato é tão aberto que, na prática, se presta a manipulação. Põe a legalidade de escanteio e dificulta o diálogo crítico entre cidadãos e agentes públicos.[13]

Tal artigo 331 do Código Penal não é taxativo, e desrespeita um dos principais pilares do Direito Penal, que é a assertividade, sendo assim, não deveria ser aplicável.

Embora a lei não expresse literalmente, é constitutivo da figura que o desacato seja praticado na presença do funcionário ofendido. Se o delito for praticado, em razão de suas funções, na ausência do funcionário haverá crime qualificado contra a honra. Portanto, deve o funcionário estar presente ao local onde a ofensa é praticada.[14]

A pena prevista é de detenção, de 6 meses a 2 anos, ou multa, segundo o artigo 331 do Código Penal, sendo, portanto, considerado infração de menor potencial ofensivo.

É vulgarmente conhecido como crime de "desacato à autoridade", mas deve-se observar que a lei brasileira não fala em autoridade, mas em funcionário público.

O Supremo Tribunal Federal detém 27 decisões relevantes sobre o tema [15]

O Superior Tribunal de Justiça desconsiderou este um crime por um tempo, mas o Supremo Tribunal Federal voltou a aplicar esse artigo[16].

Veja também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. www.planalto.gov.br http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848compilado.htm. Consultado em 13 de abril de 2019  Em falta ou vazio |título= (ajuda)
  2. «O crime de desacato (CP, art. 331)». Jusbrasil. Consultado em 13 de abril de 2019 
  3. «Desacato: Código Penal». Consultado em 29 de junho de 2022 
  4. a b c «Artigo: A inconstitucionalidade do crime de desacato sob a perspectiva da soberania popular». Migalhas. 25 de setembro de 2018. Consultado em 13 de abril de 2019 
  5. «Doutrina OAB: Imunidades do Advogado x Desacato». Blog Gran OAB. 23 de janeiro de 2018. Consultado em 13 de abril de 2019 
  6. «OAB pede que crime de desacato seja considerado inconstitucional pelo Supremo». Consultor Jurídico. Consultado em 13 de abril de 2019 
  7. «Em audiência pública, operadores do Direito pedem fim do crime de desacato». Consultor Jurídico. Consultado em 13 de abril de 2019 
  8. «STJ acolhe recurso da Defensoria Pública de SP e decide que desacato não é crime». Jusbrasil. Consultado em 13 de abril de 2019 
  9. http://www.mpf.mp.br, Ministério Publico Federal-. «STJ segue entendimento do MPF e decide que desacato não é crime». MPF. Consultado em 13 de abril de 2019 
  10. «OAB ingressa no STF para extinguir a eficácia do crime de desacato». Conselho Federal da OAB. Consultado em 13 de abril de 2019 
  11. «STJ decide que desacato a autoridade não é mais crime». noticias.uol.com.br. Consultado em 13 de abril de 2019 
  12. a b c «O crime de desacato (CP, art. 331)». Jusbrasil. Consultado em 13 de abril de 2019 
  13. a b c Mendes, Conrado Hübner (19 de julho de 2018). «Liberdade para desacatar». Época. Consultado em 13 de abril de 2019 
  14. Desacato (art. 331 do Código Penal)
  15. http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28desacato%29&base=baseInformativo
  16. «Pelo menos 5 ministros do STF são pela manutenção de desacato como crime». ga.basegroup.com.br. Consultado em 26 de fevereiro de 2019 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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