Imigração letã no Brasil – Wikipédia, a enciclopédia livre

Letónia Letão-brasileiros Brasil
Brazīlijas latvieši
Laura Rizzotto[1]
População total

~ 25.000[2]

Regiões com população significativa
São Paulo e Região Sul. No interior paulista estão em especial nas cidades de Tupã (em particular no seu distrito de Varpa) e em Nova Odessa, na região metropolitana de Campinas. Históricamente se estabeleceram primeiro em Santa Catarina e Rio Grande do Sul.[carece de fontes?]
Línguas
Português. Poucos ainda falariam letão, usado em ocasiões especiais ou entre familiares, em especial das duas primeiras gerações.[3]
Religiões
Protestantismo, sendo historicamente a maioria membros da Igreja batista e outra parte da Igreja luterana.
Grupos étnicos relacionados
letões e brasileiros brancos.

O Brasil tem um número estimado de cerca de vinte e cinco mil letões e descendentes próximos, que formariam a maior comunidade da América do Sul e uma das maiores fora da Letônia.[4][5]

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

As origens da imigração letã no Brasil podem ser atribuídas à publicação, a partir de 1889, no país europeu, de notícias e textos sobre a nação americana [nota 1], por parte de letões que já haviam estado no Brasil e descreveram positivamente o que viram nele, tanto sobre a natureza quanto sobre as colônias de imigrantes europeus que visitaram na região sul.[nota 2]

História[editar | editar código-fonte]

Os primeiros imigrantes letões (ou "letos", como eram conhecidos antigamente) chegaram ao Brasil no fim do século XIX, mais especificamente em 1890, motivados pela difícil situação econômica de sua terra natal, então parte do Império Russo. Entre outros fatores que motivaram sua vinda e dos grupos que viriam posteriormente estavam a falta de liberdade religiosa, as limitações no uso do seu próprio idioma, a dominação política russa e econômica (que impedia o acesso à terra) por parte de alemães, assim como a obrigação de prestar serviço militar por longos anos, até sete.[6]

Esses primeiros colonos se dedicaram à agricultura, em colônias fundadas em Santa Catarina (a primeira foi a do Rio Novo, hoje parte de Orleans) e no Rio Grande do Sul, sendo a pioneira neste estado a de Ijuí. Entre outros lugares em que se estabeleceram se pode citar no caso catarinense Guaramirim (distrito de Jacu-Açu) e Urubici.[7] Outros imigrantes letões formaram parte, ainda no começo do século XX (os primeiros chegaram em 1906), do núcleo colonial que se tornou o hoje município de Nova Odessa, próximo a Campinas. Eles eram parte de um grupo de colonos russos, sendo que naquela época migravam com aquela cidadania, pelo que é difícil estimar quantos milhares de letões vieram ao Brasil nesse período. Vieram tanto das colônias que já estavam estabelecidas no sul do Brasil, e que formaram parte da já citada primeira onda, que chegou em 1890 e se dedicava à agricultura, sendo majoritariamente batistas, quanto, em maiores números, diretamente da Europa, sendo este segundo grupo de luteranos. Até o começo da década de 20 se estabeleceriam no estado de São Paulo outras colônias letãs, no que hoje são os municípios de Pariquera-Açú, Corumbataí, Nova Europa e São José dos Campos. Na promoção da imigração letã no estado teve papel importante o fazendeiro e médico piracicabano Carlos Botelho, que foi secretário de agricultura durante o governo de Jorge Tibiriçá, entre 1904 e 1908 e coordenou, com auxílio de letões já estabelecidos no Brasil, a migração dos colonos que estavam no sul e a vinda de outros da Europa.[8]

Uma das construções de arquitetura típica letã encontradas no distrito.

A colônia de Varpa[editar | editar código-fonte]

Numericamente, a colônia mais importante foi a estabelecida em Varpa (Vārpa - 'espiga' , em letão), hoje distrito de Tupã, oeste paulista. Ela foi fundada em novembro de 1922, por um grupo de imigrantes membros de uma igreja batista, e liderados pelo pastor João Inkis, que se estabeleceram no Brasil buscando exercer a liberdade religiosa que viam coibida pelas autoridades bolcheviques após a Revolução de outubro de 1917.[9][10] Mais de 2000 imigrantes deram origem a uma comunidade organizada em torno a uma cooperativa (a Corporação Evangélica Palma) e das igrejas batistas locais ( cuja sede teria chegado a estar, naquela época, entre as maiores da América do Sul, com espaço para 1000 fiéis sentados), e que falou majoritariamente no seu idioma nativo até a campanha de nacionalização do Estado Novo, na década de 30.[11][12][13][7] Com o passar do tempo e as mudanças econômicas causadas pela instabilidade do modelo de exploração de cultivos comerciais aos quais os imigrantes tiveram que se submeter, muitos dos seus filhos se mudaram para os capitais, em busca de profissionalização, ou no caso de várias mulheres, para trabalhar como governantas e domésticas em casas de famílias da elite paulista. Os recursos que enviavam contribuíram para a manutenção de suas famílias e da comunidade, bem como para a melhoria técnica das estruturas produtivas da colônia.[14] Apesar da redução populacional a comunidade ainda abriga cerca de 800 habitantes.

Várias das edificações do período, construídas segundo a arquitetura típica letã, ainda se conservam. Também são herança da cultura dos imigrantes vários tipos de defumados e geleias ainda produzidos no lugar por seus descendentes.[12] Também são realizadas feiras para demonstrar o artesanato e a culinária locais.[15]

O documentário Coragem é Ter Fé – A Trajetória dos Imigrantes Letos de Varpa (dirigido por Robson Luís Moreno e produzido por tupãenses) conta a história desses primeiros imigrantes no distrito do município de Tupã.[9] O local também conta com o Museu Histórico Janis Erdberges, fundado em 1980 e que conta com um acervo que registra a história da comunidade.[16][17]

Cabe registrar também que migrantes dessa colônia, em particular a família Grinberg, foram os fundadores de Monte Verde (tradução desse sobrenome), distrito de Camanducaia, Minas Gerais.[18][19]

Algumas personalidades brasileiras de ascendência letã[editar | editar código-fonte]

A família Kopenhagen, composta pelo casal David e Anna e vinda da Letônia, se estabeleceu na capital paulista e fundou em 1928 a empresa de chocolates homônima, que se tornou uma das maiores do país e foi adquirida em 2023 pela multinacional suíça Nestlé.[20]

Notas

  1. Mais especificamente no jornal Baltijas Wehstnesis (O Mensageiro báltico) em 1889, editado em Riga, e o livro Brazilija, do ano seguinte
  2. Se trata do pastor luterano Karlis Balodis e de Peteris Sahlítis, doutor em filosofia


Referências[editar | editar código-fonte]

  1. «Laura Rizzotto, cantora brasileira com dupla cidadania, vai representar Letônia no Eurovision». G1. 28 de fevereiro de 2018. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  2. Revista Época http://epoca.globo.com/edic/214/soci1a.htm Arquivado janeiro 5, 2013 no WebCite
  3. «Línguas de imigração europeia». Enciclopédias das línguas no Brasil. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  4. «epoca.globo.com/edic/214/soci1a.htm». Consultado em 18 de outubro de 2011. Arquivado do original em 5 de janeiro de 2013 
  5. «República da Letônia». Ministério das Relações Exteriores. 30 de março de 2023. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  6. Bassini, Marili (2003). Religião e identidade étnica: a primeira Igreja Batista Leta de Nova Odessa (1906-1922 e 1980-2002). [Tese de doutorado] (PDF). [S.l.]: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas. p. 38 
  7. a b Vieira Brum, Cinthia; Onice Payer, Maria. «Leto ou letão». Enciclopédia das Línguas no Brasil. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  8. «História de Nova Odessa» 🔗. www.novaodessa.sp.gov.br. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  9. a b «Museu Índia Vanuíre realiza homenagem aos imigrantes letões – Museu India Vanuíre». Museu Índia Vanuíre. 27 de outubro de 2011. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  10. Daltozo, José Carlos. «Um pouco mais sobre a história de Varpa». Diário Tupã. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  11. Silva, Henrique M. (setembro–dezembro de 2002). «Adaptação pioneira dos imigrantes da Letônia na terra prometida». CEM – Centro de Estudos Migratórios. Travessia - Revista do migrante (44): 25. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  12. a b «Varpa (Tupã): a Europa no Oeste Paulista». Circuito Sesc de Artes. 2015. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  13. «Notícia - Varpa recebe tradicional Congresso da Associação Leta de 15 a 17 de julho - Prefeitura da Estância Turística de Tupã». www.tupa.sp.gov.br. 15 de julho de 2022. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  14. Silva, Henrique M. (setembro–dezembro de 2002). «Adaptação pioneira dos imigrantes da Letônia na terra prometida». CEM – Centro de Estudos Migratórios. Travessia - Revista do migrante (44): 27. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  15. «Notícia - Retorno do Feirart supera expectativa de público - Prefeitura da Estância Turística de Tupã». www.tupa.sp.gov.br. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  16. «Notícia - Museu de Varpa mostra vida dos imigrantes letos - Prefeitura da Estância Turística de Tupã». Prefeitura de Tupã. 25 de junho de 2014. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  17. «Turismo Paulista - Aprecesp». www.turismopaulista.tur.br. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  18. Alves, Márcio. «Saiba mais sobre a Imigração letã em Monte Verde». www.cidadeecultura.com. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  19. Silva, Arnaldo (janeiro de 2016). «Monte Verde: a vila fundada por imigrantes da Letônia». Conheça Minas. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  20. Fuentes, Patrick (7 de setembro de 2023). «Conheça a história da Kopenhagen, marca comprada pela Nestlé». Folha de S.Paulo. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  21. Mennucci Giesbrecht., Ralph (18 de outubro de 2006). «Adolfo Stern -- Estações Ferroviárias do Rio Grande do Sul». Estações ferroviárias do Brasil. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  22. a b c Purim, Andreis (18 de setembro de 2020). «4 Famosos que são Letos-Brasileiros». https://letoniabrasil.org/posts/curiosidades/4_famosos_que_sao_letos_brasileiros/. Consultado em 24 de outubro de 2023. Arquivado do original em 4 de junho de 2023 
  23. Leme, Mirela (28 de maio de 2010). «Nova Odessa é palco para encontro de comitiva leta com empresários da região». Prefeitura de Nova Odessa. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  24. «Lombada eletrônica completa 30 anos e já ajudou a salvar milhares de vidas». Conexão Tocantins. 24 de agosto de 2022. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  25. «Lombada eletrônica completa 28 anos e especialista esclarece as principais dúvidas do público sobre o funcionamento». Portal do Trânsito, Mobilidade & Sustentabilidade. 30 de agosto de 2020. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  26. Behls, Edelberto (13 de dezembro de 2021). «Batistas desligam pastor que defende releitura da Bíblia». Unisinos. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  27. «Prof. Guilherme Butler». Fundação Sidônio Muralha. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  28. «Mofolândia - ENTREVISTA COM Helena Samara». web.archive.org. 5 de abril de 2016. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  29. «Laura Rizzotto, cantora brasileira com dupla cidadania, vai representar Letônia no Eurovision». G1. 28 de fevereiro de 2018. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  30. Vaquer, Gabriel (5 de junho de 2023). «Repórter novinho da GloboNews 'fura a fila' e causa intriga nos bastidores». Notícias da TV. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  31. «HISTÓRIA DOS BATISTAS NACIONAIS». MEMÓRIA DOS BATISTAS - IGREJA BATISTA | MEMÓRIA E HISTÓRIA. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  32. Purim, João Reinaldo (20 de fevereiro de 2012). «Dr. Reynaldo Purim – Alguns dados biográficos | Por João Reinaldo Purin». Colônia Leta do Rio Novo. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  33. «Membros Titulares». Academia Brasileira de Filosofia. Consultado em 24 de outubro de 2023 
  34. LADUSÃNS, Stanislavs (1992). Gnosiologia pluridimensional. [S.l.]: Edições Loyola. p. 175. ISBN 9788515005536 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

BASSINI, Marili. Religião e identidade étnica: a primeira Igreja Batista Leta de Nova Odessa (1906-1922 e 1980-2002). Tese de Doutorado. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, 2003.

BOLDRINI, Maria Irani. A imigração leta: o Núcleo Colonial de Nova Odessa. Dissertação (Mestrado em História) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1989.

MELO, Estela Violin de. reViver a Letônia: complexo cultural de Varpa-SP. 2017. 1 CD-ROM. Trabalho de conclusão de curso (Graduação - Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Tecnologia, 2017.

MULATINHO, Heldo Victor. Palma: A Construção de uma Utopia. 1924 - 1970. Tese de Doutorado apresentada ao Depto. de Antropologia Social da FFLCH - USP, 1982.

RONIS, Osvaldo. Uma epopéia de fé: história dos batistas letos no Brasil. Brasil, Casa Publicadora Batista, 1974.

SILVA, Henrique Manoel. Os imigrantes da Letônia no oeste paulista: adaptação pioneira e construção de uma comunidade histórica e imaginária em terras brasileiras, 1922-1940. Eduem, 2002.

TUPES, Milia. Contribuição ao estudo da colonização no Estado de São Paulo: ensaio sobre a Colônia Varpa Volume 8 da Coleção Museu Paulista: Série de história. Fundo de Pesquisas do Museu Paulista da Universidade de São Paulo, 1979.

VASSILIEFF, Irina. Imigração leta no brasil: a experiencia da colônia de Varpa na Alta Paulista. 1979. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 1979.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

Colônia de Rio Novo: registros e histórias dos imigrantes letões (ou letos) que se estabeleceram em Rio Novo, hoje parte de Orleans, Santa Catarina.

Letos - União das etnias de Ijuí: vídeos das apresentações do grupo folcórico Staburags.

Museu Histórico de Varpa Janis Erdberges.

reViver a Letônia: TCC sobre Varpa, com imagens da arquitetura local.

Varpa: fotos e informações sobre o distrito de Tupã.