Medalha de Olhão – Wikipédia, a enciclopédia livre

Verso e reverso da primeira representação conhecida da Medalha de Olhão
(in Memoria das Medalhas, 1861)

A Medalha de Olhão foi concedida aos olhanenses a 15 de Novembro de 1808 pelo então príncipe regente D. João (futuro D. João VI, como prémio da primeira revolta bem sucedida contra as invasões francesas, iniciada naquela localidade em 16 de Junho de 1808.

Contextualização[editar | editar código-fonte]

Tendo apenas um século antes desanexado-se da freguesia de Quelfes, o lugar de Olhão contaria em 1808 já com cerca de cinco mil habitantes, dedicando-se a maioria da população à actividade piscatória. No contexto das guerras peninsulares, o seu povo foi um dos mais explorados pelo governo francês, embora apenas durante cerca de dois meses (mais precisamente entre o dia 14 de Abril de 1808 e o dia 16 de Junho do mesmo ano. As proibições e pressões contínuas feitas aos pescadores, que eram obrigados a não se afastarem muito da costa e para regressarem antes do sol se pôr, para além dos inúmeros impostos que tinham que pagar sobre todos os pretextos, terão sido dois motivos bem fortes para que no dia 16 de Junho de 1808 a população se revoltasse na prática contra os franceses (ver revolta de Olhão). De facto, apesar da população de várias localidades do norte do país se ter rebelado alguns dias antes do lugar de Olhão, foi neste lugar que se deu início aos confrontos físicos entre milícias portuguesas e as tropas napoleónicas. Já depois dos franceses terem evacuado o Algarve, alguns pescadores olhanenses decidiram rumar ao Brasil num caíque chamado Bom Sucesso, no início de Julho de 1808, para contar ao príncipe regente a boa nova (ver viagem do Caíque Bom Sucesso).

Condecoração da Medalha[editar | editar código-fonte]

Os olhanenses chegaram ao Rio de Janeiro no dia 22 de Setembro do mesmo ano, tendo logo sido recebidos pelo príncipe regente. Finalmente, no dia 15 de Novembro do mesmo ano, já depois de outras embarcações portuguesas terem chegado ao Brasil com notícias das outras sublevações populares ocorridas no país, D. João emitia um alvará onde elevava o lugar de Olhão a Vila de Olhão da Restauração, dando também direito a que "os habitadores dela usem de uma medalha, na qual esteja gravada a letra O com a legenda: Viva a Restauração, e o Príncipe Regente nosso senhor".

Referências à Medalha[editar | editar código-fonte]

A Memoria das medalhas e condecorações portuguezas e das estrangeiras (sic) de Manuel Bernardo Lopes Fernandes (autor que cita parcialmente o referido alvará régio de 15 de Novembro de 1808) adianta que a medalha não tem reverso e precisa que a legenda indica «Viva a Restauração e o Principe R. N. S.».[1]

Segundo o historiador e arquivista Alberto Iria, Pedro Vitorino reproduziu esta mesma medalha em 1928, no seu livro O grito da independência em 1808 (p. 103).
Em 1941, o citado Alberto Iria publicava A invasão de Junot no Algarve, onde inseria outra reprodução da dita medalha (entre as páginas 292-293), onde se pode ver, a mais, "um acessório para prender a medalha que não deve ter pertencido ao original". Então, a medalha era "muitíssimo rara". Alberto Iria referia que a sua fonte tinha sido um Catálogo de J. Schulman, em cuja p. 24 reproduzia a dita medalha (com o n.º 213), sendo então a única destas medalhas conhecida. Segundo o aludido Catálogo (Alberto Iria, infelizmente, não indica o ano de edição, o título completo ou mais pormenores, dizendo apenas que teve conhecimento desta obra através do Comandante Afonso Dornelas), esta medalha era de prata, tinha 28 mm de diâmetro e 6,5 gramas de peso, e pertencera "à colecção de um distinto amador português residente em Paris", colecção esta vendida na Holanda, em Amsterdão, a 31 de Outubro de 1927. Foi classificada, por Schulmann, como Portative. Très Belle. Forte Rare.
Alberto Iria adiantava ainda que Afonso Dornelas lhe tinha noticiado a existência de um exemplar da medalha "na colecção do falecido Dr. Carvalho Monteiro".
Num Catálogo da Exposição "D. João VI e o seu tempo", decorrida no Palácio da Pena em 1999, aparecem reproduzidas duas medalhas destas, uma em ouro e outra em prata, sendo que a primeira pertencera ao militar farense Sebastião Drago Cabreira, que junto com os seus irmãos, fora um dos cabecilhas da revolta farense contra os farenses.

Um novo contributo para a história desta medalha foi dado em 2008, com a publicação do livro No Bicentenário da Guerra Peninsular - Ordens e Condecorações Portuguesas 1793-1824, da autoria de Paulo Jorge Estrela. No artigo intitulado "Medalha da Restauração de Olhão", para além de referir brevemente o episódio da revolta de Olhão, o autor narra pormenorizadamente a viagem do Caíque Bom Sucesso ao Brasil, transcrevendo o Alvará Régio de 15 de Novembro de 1808 e descrevendo as principais recompensas dadas aos seus tripulantes. Ademais, entre outras imagens, o artigo é ilustrado com duas medalhas de Olhão da Restauração, uma das quais com o estojo supostamente original, acrescentando o autor que terá havido pelo menos duas cunhagens da dita medalha.

Finalmente, também em 2008, a APOS (Associação de Valorização do Património Cultural e Ambiental de Olhão), juntamente com o ELOS Clube de Olhão, empreenderam uma viagem ao Brasil, em comemoração do bicentenário da revolta olhanense e da viagem do Caíque Bom Sucesso. Nesta viagem estabeleceu-se contacto com Eduardo André Chaves Nedehf, um auto-alegado descendente do Marquês de Viana, portador duma destas medalhas raríssimas, a qual foi ofertada em Dezembro de 2008 ao Museu Municipal de Olhão. Esta medalha (que parece provir de uma cunhagem mais recente que as referidas anteriormente), tinha sido oferecida ao primeiro Marquês de Viana na década de 1830, pelo próprio Município de Olhão, durante as guerras liberais que dividiram o país. Nessa época, tal como o primeiro Marquês de Viana, os olhanenses optaram pelo movimento liberal e enfrentaram encarniçados ataques dos miguelistas que, aliás, se apoiaram nas cidades vizinhas de Faro e Tavira. Tendo o primeiro Marquês de Viana encontrado nos olhanenses os aliados necessários para o aprisionamento do navio de guerra Urânia, então nas imediações, estes decidem entregar-lhe a medalha, que se tem conservado na posse da família até ao último dia 7 de Janeiro de 2009, data em que mediante acordo firmado em sessão solene no Salão Nobre da Câmara Municipal de Olhão, a mesma foi entregue para exposição pública no Museu Municipal da mesma cidade.

Segundo se percebe através dos raros exemplares conhecidos, fotografados ou reproduzidos, foram feitas várias emissões desta medalha, talvez mesmo em épocas distintas, existindo inclusive alguns exemplares (duma tiragem talvez bastante reduzida) em prata ou ouro. Dever-se-á salientar que estas cunhagens teriam ocorrido não no Brasil, mas sim já em Portugal, dado que a primeira medalha honorífica feita no Brasil data de 1820 e consagra a ascensão de D. João VI ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves (cujo reverso tem uma inscrição indicando que esta medalha foi a primeira cunhada no Rio de Janeiro).

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

Notas e referências

  1. Manuel Bernardo Lopes FERNANDES, Memoria das medalhas e condecorações portuguezas e das estrangeiras, 1861, pp. 62-63.
    O mesmo autor reproduz, com o número 74, a referida medalha (reprodução inserida no início deste artigo). Como Lopes Fernandes indica, tal reprodução é um "desenho exacto desta medalha bastante rara", desenho este da autoria de Teixeira de Aragão. Ver [1].

Ver também[editar | editar código-fonte]

Revolta de Olhão

Viagem do Caíque Bom Sucesso

Vila de Olhão da Restauração

Alvará Régio de 15 de Novembro de 1808