Primeira revolta de Boa Vista – Wikipédia, a enciclopédia livre

A primeira revolta de Boa Vista do Tocantins, por vezes denominada de primeira guerrilha do Tocantins, foi uma série de acontecimentos que ocorreram no norte do estado de Goyaz, envolvendo também o estado do Maranhão. As hostilidades se iniciaram em março de 1892, e só foram finalizadas após a mediação de autoridades maranhenses e do frei Gil de Vila Nova.[1]

O conflito envolveu grupos oligarcas locais, que se enfrentaram após a proclamação da república, pelo domínio do poder na esfera regional. A revolta também foi de cunho emancipacionista, pois tinha o objetivo de desvincular o norte de Goyaz da tutela de Vila Boa de Goyaz.[1]

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

A província de Goiás, que à época do império, era governada por grupos conservadores ligados a Dom Pedro II, teve sua frágil estrutura política abalada após a proclamação da república, feita pelo Marechal Deodoro da Fonseca. A unidade do estado estava continuamente sob ameaça de movimentos secessionistas, principalmente alojados na região norte do território.[2]

Inúmeras declarações separatistas haviam sido feitas, sendo as mais relevantes por Theotônio Segurado, que por seguidas vezes intentou criar a província de São João da Palma (também chamada de São João das Duas Barras), e por Leão Leda, que chegou a declarar a República de Pastos Bons, que englobava os territórios do atual estado do Tocantins, sul do Pará, e sul do estado do Maranhão.[3]

Outro fator que antecedeu a revolta foi a situação de caos vivida na região após a destituição das autoridades constituídas pelas forças imperiais. Isto permitiu que outros grupos oligarcas almejassem ascender a política local, normalmente utilizando meios coercitivos para tal.[4]

A revolta[editar | editar código-fonte]

Desdobramentos iniciais[editar | editar código-fonte]

O coronel Carlos Gomes Leitão, chefe político de Boa Vista do Tocantins ligado ao Partido Republicano de Goiás (bullhonistas/deodoristas), se beneficiou politicamente com a queda do império, pois viu seus inimigos políticos (ligados ao império) serem destituídos. Aproveitando-se da situação, tomou o poder local, e tornou-se deputado constituinte, e chefe da Coletoria de Impostos da Província de Goyaz.[5]

Após tomar o poder local Leitão, sendo ligado ao então presidente do estado do Maranhão, Manuel Inácio Belfort Vieira, disseminou na região a proposta de separação da região norte de Goyaz, e a anexação desta ao estado do Maranhão. Não obtendo apoio entre os próprios políticos maranhenses, propõe que o norte de Goyaz se separe juntamente com o sul do Grão-Pará para formar a província de Boa Vista. Os movimentos acirraram os ânimos dos demais grupos políticos conservadores locais, os florianistas, e também chamou a atenção dos grupos políticos de Vila Boa e Porto Nacional, que imediatamente reagiram. A diocese de Vila Boa de Goyaz publicou em seu periódico uma nota repudiando a atitude do coronel, e em seguida o frei Francisco de Monsavito o excomungou.[4][6]

Em 1893 Leitão chegou a declarar-se presidente (governador) da província autônoma de Boa Vista, mas não conseguiu o suporte político que desejava, e acabou por fazer mais inimigos, principalmente dentro da diocese de Goyaz.[2]

Leitão, se aproveitando de sua posição como juiz da comarca de Boa Vista, arquivara em 1890 o processo criminal de seu inimigo político, Cláudio Gouveia (acusado de assassinato), e passou a leiloar os bens pertencentes a este de forma irregular, muitas vezes adquirindo os próprios bens leiloados. Ao assumir o cargo de deputado constituinte teve de se licenciar de sua função de juiz, e em seu lugar foi nomeado o pernambucano Henrique Hermeto Martins.[5] O juiz Hermeto Martins reabriu o processo criminal de Cláudio Gouveia e o inocentou, revertendo também os leilões irregulares feitos por Leitão. Leitão imediatamente reagiu, e tentou impor a destituição do magistrado, não logrando sucesso. Este ato ocasionou o estopim da crise política na região.[4]

Acirramento do conflito[editar | editar código-fonte]

No início de março de 1892 frei Gil de Vila Nova, apoiado pela diocese, e pelo intendente municipal Francisco de Sales Maciel Perna, inimigo político de Leitão, expulsam-no da cidade de Boa Vista, obrigando-o a ir para Carolina no Maranhão.[5] Neste episódio um irmão de Leitão acaba por ser assassinado.[4]

Leitão e seu grupo político arregimentaram armas e peões (pistoleiros), e em 31 de março de 1892 tentaram retomar o controle da cidade. O confronto seguiu até 2 de abril, com Leitão sendo novamente expulso.[5]

Após este episódio Leitão tentou consecutivas vezes tomar o controle de Boa Vista. Em agosto de 1893, Leitão retoma o controle da cidade ao prender o intendente Maciel Perna. Ele consegue enviá-lo preso ao Rio de Janeiro, mas Maciel Perna livra-se por meio de um habeas corpus e retorna a cidade.[2] Leitão aproveita-se da oportunidade e declara-se presidente (cargo á época correspondente ao de governador) da província autônoma de Boa Vista, estabelecendo seu governo na cidade homônima.[2] Em dezembro após um novo confronto perde definitivamente o controle da cidade, e é expulso.[5][7]

Desfecho[editar | editar código-fonte]

Após fracassadas tentativas de retomar o controle de Boa Vista, Leitão aceita negociar o fim do conflito com os irmãos Maciel Perna em fevereiro de 1894. Com mediação de políticos maranhenses e do frei Gil de Vila Nova o conflito acaba, com Leitão e seu grupo político abandonando definitivamente a região. Leitão se dirige com seus aliados e sua família para o Grão-Pará.[4]

Após o armistício de 1894 fortaleceu-se na região o grupo conservador, ligado ao Partido Democrata, liderado pelos irmãos Maciel Perna. O armistício também enfraqueceu o projeto secessionista regional, que ficou paralisado até 1907, entretanto serviu para fazer ressurgir a luta pela emancipação de Tocantins, que havia ficado estagnada desde a morte de Theotônio Segurado.[3]

A crise política deixou profundas marcas na sociedade local.[8] Este fato acabou levando a Segunda revolta de Boa Vista, que ocorreu devido aos mesmos fatores que levaram a primeira: questões emancipacionistas e luta entre grupos oligarcas pelo domínio da política local.[1]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c ALMEIDA, Donizete. «Resumo: As Revoltas de Boa Vista do Norte Tocantins: Padre João – João de Sousa Lima e as relações sociais no extremo norte de Goiás séculos XIX- XX.». Colégio Girassol de Tempo Integral [ligação inativa]
  2. a b c d DA SILVA, Ignácio Xavier (1935). O crime do coronel Leitão: sedição na comarca de Boa Vista do Tocantins do estado de Goiás: 1892-1895. Vila Boa de Goyaz (Cidade de Goiás): Gráfica Popular 
  3. a b MARTINS, Mário Ribeiro. «Tolstoi e o Padre João: Quem foi Leão Leda?». Usina de Letras 
  4. a b c d e MARTINS, Mário Ribeiro. «O Crime do Coronel Leitão». Usina de Letras 
  5. a b c d e GOMEZ, Luis Palacín (1990). Coronelismo no Extremo Norte de Goiás: O Padre João e as Três Revoluções de Boa Vista - Tocantinópolis. São Paulo: Edições Loyola. 121 páginas 
  6. «Carlos Gomes Leitão». Maraba Online [ligação inativa]
  7. «Perfil biográfico de Carlos Gomes Leitão». AL Goiás 
  8. «História». Universidade Federal do Tocantins [ligação inativa]