Sílvia Waiãpi – Wikipédia, a enciclopédia livre

Sílvia Waiãpi
Sílvia Waiãpi
Deputada Federal pelo Amapá
Período 1º de fevereiro de 2023
até a atualidade
Legislatura 57ª (2023–2027)
Dados pessoais
Nascimento 29 de agosto de 1975 (48 anos)
Macapá, Amapá
Nacionalidade brasileira
Progenitores Pai: Seremeté
Partido PSL (2020–2022)
UNIÃO (2022)
PL (2022–presente)
Religião evangelismo
Ocupação
Serviço militar
Lealdade  Brasil
Serviço/ramo Brasão do Exército Brasileiro Exército Brasileiro
Anos de serviço 15 anos
Graduação Tenente
Unidade Centro de Preparação de Oficiais da Reserva

Sílvia Nobre Waiãpi[nota 1] (Macapá, 29 de agosto de 1975) é uma política, atriz, militar, atleta e fisioterapeuta brasileira. Filiada ao Partido Liberal (PL)[2]. Politicamente, está alinhada com o bolsonarismo. Em 2022 elegeu-se deputada federal pelo Amapá, com 5 435 votos.[3]

Início de vida[editar | editar código-fonte]

Sílvia foi adotada por uma família de Macapá, sendo criada por um professor, que iniciou a sua alfabetização.[4] Em 2010, de acordo com o censo demográfico, os waiãpis constituíam um grupo de 945 pessoas, habitando o norte do Estado, perto da divisa com a Guiana Francesa. Aos quatro anos, Waiãpi sofreu um acidente na floresta, tendo a perna direita transpassada por um pedaço de madeira.[5] Foi necessário realizar uma cirurgia e para isso, Waiãpi precisou permanecer por quatro meses em Macapá.[6] Waiãpi conta que desde o primeiro contato com a urbanização, no hospital de Macapá, ficou maravilhada com essa realidade.[5] Começou a estudar aos sete anos,[7] ficando fascinada pela realidade escolar, em particular com as cerimônias cívicas relacionados à bandeira, ao hino nacionais e ao ensino de Moral e Cívica, característicos da educação no período da ditadura militar brasileira, assim como pela noção que lhe foi incutida de ser uma verdadeira brasileira.[5] Desde o contato com essas realidades em 2011, Waiãpi afirmou, chorando, em entrevista a Jô Soares:

Eu passei a minha infância inteira puxando a saia das professoras e pedindo, por favor, para eu hastear aquela bandeira [do Brasil], mas ninguém deixava. Só as crianças brancas e não índias podiam
— Sílvia Waiãpi

Vida pessoal[editar | editar código-fonte]

Aos treze anos deu à luz sua primeira filha, Ydrish, deixando a aldeia um ano depois. Mudou-se sozinha para o Rio de Janeiro, tornando-se moradora de rua aos quatorze anos. Em 2011, para poder se alimentar vendeu uma pedra que considerava sagrada, que levara consigo, conseguindo o suficiente para dois dias. Depois começou a trabalhar vendendo livros de porta em porta.[6]

Além de Ydrish, Waiãpi teve outros dois filhos, enquanto no Rio de Janeiro: Tamudjim, aos 15 anos, e Yohanna, aos 17. Posteriormente contraiu matrimônio com um militar,[6] tendo em 2018 uma neta.[7]

Waiãpi é evangélica.[8] Em 2012, afirmou em entrevista a Ronnie Von:

Eu tenho muito orgulho de ser brasileira. Meu maior orgulho é ser indígena, é ser mulher, poder erguer minha cabeça todos os dias e ir trabalhar e acreditar que vou salvar o Brasil.
— Silvia Waiãpi[6]

Silvia manteve sempre os laços com o pai, o cacique Seremete, voltando à aldeia natal uma vez por ano, nas férias.[4]

Carreira artística[editar | editar código-fonte]

Enquanto no Rio de Janeiro, conheceu um camelô que a ajudou a encontrar um local para viver com a sobrinha, que tinha acabado de se divorciar. Conseguiu empregar-se no Círculo do Livro, conhecendo poetas e artistas e começando a se desenvolver culturalmente, ao mesmo tempo em que frequentava a escola. Ainda adolescente, começou a escrever e declamar poesias.[6]

Waiãpi ingressou num grupo de atores, estudou teatro, formando-se em artes cénicas com 24 anos. Trabalhou na TV Globo, como aderecista do departamento de figurino, preparadora de elenco da minissérie A Muralha e pesquisadora de texto na novela Uga Uga, ambas estreadas em 2000. Estas funções viriam a lhe render depois papéis como atriz.[7]

Após a interrupção causada por sua carreira esportiva, voltou a atuar em 2006, interpretando Pena Levinha, na novela Bang Bang, da TV Globo, e participando da minissérie A Cura, da Rede Globo, em 2010.[6]

Viveu o principal papel como Domingas, uma indígena tirada da sua tribo para trabalhar como doméstica na minissérie Dois Irmãos, exibida em 2017, inspirada no livro homónimo de Milton Hatoum. Contracenou com o protagonista Cauã Reymond, que interpretava os gêmeos Omar e Yaqub.

Procuravam uma indígena pra fazer teste e não encontravam. Aí o produtor de elenco lembrou da minha entrevista [com Jô Soares]. Quando me chamou para conversar é que ele descobriu que já havia feito outros trabalhos na casa.
— Sílvia Waiãpi, em entrevista ao portal UOL[6][7]

Esporte[editar | editar código-fonte]

A carreira artística de Waiãpi acabou sendo interrompida pela atividade esportiva. Em entrevista a Jô Soares, gravada em 2012, Waiãpi revelou um incidente traumático como sendo o gatilho para sua trajetória no atletismo. Após ser atacada por um homem enquanto fazia uma caminhada no Rio de Janeiro, decidiu começar a treinar corrida para evitar passar por situações semelhantes. Interessou-se pela modalidade, passando a participar de competições. Foi descoberta por um técnico do Vasco da Gama, passando a treinar no clube. Em 2003, graças ao seu bom desempenho, conseguiu uma bolsa de estudo para estudar fisioterapia no Centro Universitário Augusto Motta.[6]

Carreira militar[editar | editar código-fonte]

Após várias especializações, um trabalho como fisioterapeuta com um grupo de fuzileiros navais a fez interessar-se pela carreira militar.[7] Em 2019, Waiãpi contou em entrevista que em 2007 a sua família havia sido vítima de uma violência muito grande no Rio de Janeiro, tendo o marido sequestrado e assassinado. Isso fez com que passasse a ter uma percepção maior sobre segurança pública, atividades de inteligência e segurança nacional.[5]

Em 2009, Waiãpi tentou entrar para as Forças Armadas, sem sucesso. Tentou novamente em 2010, sendo aprovada para a Marinha e para o Exército, vindo a escolher o Exército. Segundo Waiãpi, a escolha ocorreu porque "sua pele é verde oliva".[7] Em 2011, tornou-se a primeira mulher indígena incorporada no Exército Brasileiro, com o posto de tenente, sendo aprovada com uma das melhores pontuações no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (Cpor) do Rio de Janeiro, onde fez o estágio. [9]

À data da incorporação, Waiãpi estava fazendo pós-graduação em gênero e sexualidade pelo Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.[9]

Em 2016, passou a ocupar a função de chefe do serviço de medicina física e reabilitação em fisioterapia no Hospital Central do Exército, em Benfica, na zona norte do Rio de Janeiro.[7] Tem atualmente o posto de primeiro-tenente.[6][10]

Atividade política[editar | editar código-fonte]

Waiãpi defende a integração dos índios à sociedade formal, sobretudo por meio da continuidade dos estudos. A tenente vê um papel decisivo das Forças Armadas na política indigenista brasileira, uma vez que os militares têm meios e pessoal para chegar a comunidades muito afastadas e de difícil acesso, levando apoio social e exercendo ações na área de saúde.[9]

Em novembro de 2018, foi uma das quatro mulheres que faziam parte do grupo de transição anunciado por Jair Bolsonaro, então do PSL. Segundo Waiãpi, Bolsonaro não é contra os indígenas.[6]

Waiãpi é próxima da ex-titular do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, e da primeira-dama brasileira, Michelle Bolsonaro.[8]

Encontro com representante do Governo do Amapá para fechamento de parceria para combater doenças em áreas indígenas, em julho de 2019

Secretaria Nacional de Saúde Indígena[editar | editar código-fonte]

A 24 de abril de 2019, assumiu o posto de secretária de Saúde Indígena do Ministério da Saúde,[8][5] sendo indicada pelo então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.[1] A sua condução foi comemorada por Damares Alves, que publicou nas suas redes sociais: "Gente, aqui vai um recado para aqueles que disseram que Bolsonaro ia perseguir índio no Brasil. O presidente da Funai, Franklimberg de Freitas, é índio, a secretária nacional de saúde indígena é índia, a ministra é mãe de índia. É o governo Bolsonaro fazendo a diferença". Por outro lado, a indicação de Waiãpi gerou indignação em parte do movimento indígena. Em julho, lideranças da principal organização dos povos tradicionais, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), ocuparam a Sesai pedindo a exoneração da secretária. Um comunicado da Apib, no dia da ocupação, afirmava: "Silvia Waiãpi, que além de não entender nada de gestão pública, envergonha os povos indígenas do Brasil, ao se colocar a serviço de interesses escusos de quem quer que seja e de um governo declaradamente anti-indígena".[1]

Um de seus primeiros atos no cargo foi autorizar o pagamento de uma fatura de 4,9 milhões em serviço de transporte aéreo em Roraima que a diretoria da Secretaria era contra pagar, pois o cobrador, a Voare Táxi Aéreo, estava com o contrato vencido. Amparando-se em um parecer da Advocacia Geral da União (AGU), Waiãpi liquidou a fatura.[8]

Processo do Ministério Público Federal[editar | editar código-fonte]

Em 2 de dezembro de 2019, o Ministério Público Federal (MPF) no Pará pediu uma multa diária de 13 milhões de reais ao ministério da Saúde, e outra multa a Waiãpi, enquanto secretária especial de saúde indígena, por descumprimento de uma decisão judicial que deveria garantir atendimento diferenciado a indígenas no estado. O processo arrastava-se havia quatro anos, referindo-se à prestação de serviços de saúde a povos indígenas em terras tradicionais ainda não homologadas no baixo Tapajós, envolvendo pelo menos treze etnias que deveriam ser atendidas. A ação do MPF visava ainda garantir o atendimento a indígenas que vivem nos centros urbanos da região, alegando agravos à saúde dos indígenas.[1]

A decisão que deu ganho de causa ao MPF, proferida em 2017 e confirmada em janeiro de 2019, previa três etapas para atender os indígenas: cadastro dos que passariam a ser usuários da saúde diferenciada; inclusão dos usuários na Casa de Saúde Indígena em Santarém; seleção e contratação das equipes para realizar o atendimento. Todas estas etapas foram cumpridas, mas, segundo o MPF, após Waiãpi assumir o cargo, o processo foi paralisado, tendo a secretária optado por não cumprir a decisão "de forma consciente e voluntária", não autorizando o trabalho de equipes multidisciplinares de saúde indígena na região. Na ação, enviada em ofício à Justiça Federal de Santarém, o MPF argumentou que, entre 2016 e 2018, havia empecilhos burocráticos, como orçamento insuficiente e licitação que deveria ser feita, impedindo que a Sesai colocasse a equipe em campo. Em fevereiro de 2019, entretanto, houve um processo de seleção público que selecionou dois enfermeiros, dois cirurgiões dentistas, dois auxiliares de saúde bucal e seis técnicos de enfermagem para atuar no baixo Tapajós, sendo os nomes dos selecionados publicados em 2 de maio. Os selecionados chegaram a ser apresentados para os indígenas para começar a trabalhar. No entanto, "por descumprimento voluntário" de Waiãpi, as equipes não estavam atendendo os indígenas da região. A sua contratação não foi autorizada, não existindo qualquer sinalização de que iria rever sua decisão.[1]

Conselho de Promoção da Igualdade Racial[editar | editar código-fonte]

Em fevereiro de 2021, foi nomeada Conselheira Nacional de Promoção da Igualdade Racial, cargo vinculado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, dirigido por Damares Alves. A principal missão é propor políticas de promoção da igualdade racial, com ênfase na população negra e em outros segmentos raciais e étnicos da população brasileira, devendo ainda propor alternativas para a superação das desigualdades raciais, do ponto de vista econômico, social, político e cultural. No mesmo mês, visitou a comunidade remanescente de quilombo, na APA do Curiaú, em Macapá.[10]

No mesmo mês foi convidada a se filiar ao Patriotas, legenda muito próxima de Jair Bolsonaro, com a proposta de disputar a sua única cadeira ao Senado Federal, que seria renovado em 2022.[10]

Comissão de campanha de Jair Bolsonaro[editar | editar código-fonte]

No dia 7 de outubro de 2022, após assumir a coordenação da campanha de reeleição do presidente Bolsonaro, o Ministério Público Eleitoral apresentou denúncia contra Silvia, alegando que a deputada, até então candidata, utilizou-se de 9 mil reais captados do fundo eleitoral, valor que foi gasto em uma harmonização facial. A denúncia foi feita pela própria coordenadora de campanha da Waiãpi, Maete Mastop, que junto de um advogado procurou o Ministério Público Eleitoral para denunciar que Waiãpi pediu a ela para que transferisse o referido valor da sua conta de campanha para a conta pessoal da sua coordenadora, e que na data foi solicitado por Waiãpi que a mesma transferisse o valor da sua conta pessoal para a conta do profissional que fez o procedimento, alegando que haveria a restituição do valor assim que saísse seu pagamento de militar da reserva. Todavia ao perceber que não foi pago e que foi cúmplice de um ato ilícito, a coordenadora procurou o MPE. Na representação, o promotor solicitou que fosse suspensa a diplomação da candidata e que houvesse a cassação de seu mandato. Por fim, o processo continuou em andamento.[11]

Eleição para deputado federal do Amapá[editar | editar código-fonte]

Sílvia Waiãpi elegeu-se deputada federal no Amapá pelo PL, sendo a deputada menos votada do Brasil, com 5 435 votos. Ela recebeu apoio de nomes como Eduardo Bolsonaro, Damares Alves e Carla Zambelli, o que levou a críticas da Bancada do Cocar.[12]

Durante as eleições, entrou com uma ação no Tribunal Regional Eleitoral contra os presidentes nacional e regional de seu partido, Valdemar Costa Neto e Alex de Almeida Pereira, os acusando de repassar menos verbas por ela ser negra, indígena e bolsonarista. Ela recebeu apenas 126 mil reais, enquanto Kaká Barbosa recebeu 1 milhão e Mariana Souto recebeu 500 mil. Também afirma que o partido não enviou seu material de campanha para passar no horário eleitoral gratuito por não ter apoiado a eleição de Davi Alcolumbre, desafeto de Bolsonaro.[13]

Notas e referências

Notas

  1. Seu nome de registro é Silvia Nobre Lopes.[1]

Referências

  1. a b c d e Alex Tajra (3 de dezembro de 2019). «MPF pede multa e diz que secretária não leva saúde a indígenas de propósito». UOL. Consultado em 27 de janeiro de 2023 
  2. «Silvia Waiãpi». Diário do Rio. Consultado em 9 de outubro de 2022 
  3. Carlos Carone e Mirelle Pinheiro (4 de outubro de 2022). «Bolsonarista, primeira indígena oficial do Exército é eleita deputada federal». Metrópoles. Consultado em 27 de janeiro de 2023 
  4. a b Odilla, Fernanda (29 de julho de 2019). «Quem são os wajãpi, guardiões de terra cobiçada por garimpeiros ilegais e mineradoras». BBC News Brasil. Consultado em 6 de fevereiro de 2022 
  5. a b c d e «Entrevista com a secretária Especial de Saúde Indígena, Sílvia Waiãpi». Fundação Nacional do Índio. 22 de maio de 2019. Consultado em 6 de fevereiro de 2022 
  6. a b c d e f g h i j Mello, Lucas (10 de novembro de 2018). «Atriz, militar, atleta: quem é Sílvia Waiãpi, a índia do time de Bolsonaro». VEJA. Consultado em 5 de fevereiro de 2022 
  7. a b c d e f g Barbon, Júlia (9 de novembro de 2018). «Índia da equipa Bolsonaro foi sem-abrigo, entrou em novelas e foi atleta». www.dn.pt. Consultado em 5 de fevereiro de 2022 
  8. a b c d André Barrocal (6 de fevereiro de 2020). «Secretária de Saúde Indígena de Bolsonaro limpa gavetas e deve deixar o governo - CartaCapital». Carta Capital. Consultado em 27 de janeiro de 2023 
  9. a b c Platonow, Vladimir (3 de fevereiro de 2011). «EBC». memoria.ebc.com.br. Consultado em 6 de fevereiro de 2022 
  10. a b c Barbosa, Cleber (21 de fevereiro de 2021). «Indígena amapaense pode se candidatar a senadora, em partido bolsonarista». Diário do Amapá. Consultado em 5 de fevereiro de 2022 
  11. Fabiana Figueiredo (7 de outubro de 2022). «Deputada federal eleita no Amapá, Silvia Waiãpi é acusada de pagar harmonização facial com dinheiro de campanha». G1. Consultado em 9 de outubro de 2022. Cópia arquivada em 9 de outubro de 2022 
  12. Jéssica Alves (8 de outubro de 2022). «Silvia Waiãpi: quem é a deputada indígena criticada pela bancada do cocar». UOL. Consultado em 9 de outubro de 2022 
  13. João Gabriel (19 de setembro de 2022). «Bolsonarista diz que foi discriminada pelo PL por ser indígena e apoiadora do presidente». Folha de S.Paulo. Consultado em 9 de outubro de 2022. Cópia arquivada em 9 de outubro de 2022 

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